Divagações, Vinhos

Vinhos naturebas: solo e terroir.

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De acordo com a legislação brasileira, o vinho é considerado “todo e qualquer mosto de uva fermentado que atinge certo grau alcoólico”. Falando assim, parece até simples — e na verdade é mesmo. Mas será que, para fazer vinho, basta amassar a uva e esperar que ela fermente? Resumidamente, na teoria, é. Na prática, nem tanto.   

Existem muitas maneiras de fazer vinho.  O que antigamente seria apenas amassar a uva e esperar que o “vinho vire vinho”, se tornou ao longo do tempo um imenso leque de opções onde cada pessoa pode seguir o caminho que bem entender: desde a condução dos vinhedos, seu tratamento, amadurecimento dos vinhos e estilo de vinificação, hoje tudo é uma questão de escolha dentro deste mundo. 

Mas o mais importante, independente de todo o resto, é que para se ter um vinho de qualidade, precisamos ter uma boa fruta – ou seja, uma boa uva. E isso dá um trabalho do cão. Por isso, desconfie de quem faz vinho tem as mãos muito bem tratadas: boa parte dos grandes vinhateiros que conheço tem as mãos mais parecidas com as mãos do meu jardineiro do que com as mãos de um lorde.  

Quando vemos o vinho na taça, ali, lindo, suculento – às vezes esquecemos de todo o trabalho por trás dele. Do trabalho para se fazer o vinho e do trabalho para se colher as uvas. O plantio de uvas para vinho nada mais é do que um cultivo agrícola como qualquer outro, e exige esforços da mesma maneira. O homem tem que estar em contato constante com a terra, com as videiras, para entender o que se passa por ali e saber como administrar um problema ou outro, como cuidar melhor de cada parreira e de cada variedade; além, claro, de saber os momentos certos para poda, para eventuais tratamentos e para a tão esperada colheita. 

Sim senhores, o vinho também é um produto agrícola – portanto, sim, tudo começa na terra. 

Primeiro, temos de explicar um conceito extremamente importante e bastante mal utilizado, sem o qual é impossível comelar a falar sobre vinho: o terroir. 

Esse termo tem origem no latim territorium, que significa “terra”, “terreno”. 

Você já deve ter ouvido essa expressão por aí. Muito mais que uma palavra, é um conceito.

Terroir é um pedaço de terra onde tudo que pertence à ele está sujeito à condições específicas que só existem ali: o clima, o solo, a fauna, a flora… microorganismos como fungos, leveduras e bactéricas acima e abaixo da terra, influências de chuvas, ventos, iluminação, calor do sol, e por aí vai.   

Ou seja, terroir é aquele lugar onde estão plantadas as uvas sobre as mesmas condições. E isso vale também para outras coisas: maçãs, bananas, temperos, leite, alface. Já experimentou uma água de coco baiana e uma água de coco pernambucana? Pois é. Questão de terroir. O terroir é a grande chave do por que  um produto tem gosto diferente do outro, quando plantado em lugares diferentes. E com a uva, é a mesma coisa. 

O homem também faz parte do terroir, pois ele trabalha as videiras – e cada um faz de um jeito, portanto, acaba influenciando no próprio ambiente. Mas influenciar não significa dominar ( ou não deveria significar, mas infelizmente passamos algumas boas décadas fazendo isso nos vinhedos e na agricultura em geral, o que andou gerando muitos problemas por aí, inclusive na nossa saúde). 

Não sou eu que digo isso. Grandes nomes do mundo do vinho já sabem que deixar a natureza seguir seu curso é a chave para um vinho bom e equilibrado; pois com um domínio absoluto do homem no processo, a expressão do vinho vai ser apenas um trabalho humano. E o vinho, em primeiro lugar, é a expressão da natureza de seu terroir. Me desculpem seres humanos, mas a natureza está aí a muito mais tempo do que nós – então cabe a nós abaixar a cabeça e respeitá-la um pouco.

Voltando ao terroir: quando temos lugares com pouca interferência do homem, percebemos que eles são muito complexos na sua biodiversidade: plantas, animais, bichinhos em geral que são totalmente diferentes do vizinho. Quando vamos para cidades grandes ( mais interferência do homem ), isso não se nota tanto. Mas os passarinhos urbanos com certeza são diferentes em São Paulo e no Mato Grosso do Sul. Perceberam? Tudo é uma questão de terroir. De uma maneira metafórica, até você, o seu sotaque e seus costumes podem ser encarados como parte do seu próprio terroir: sua casa, seu bairro, seu estado, seu país.  

Essa é uma das razões do por que um vinho no sul da França é tão diferente de um vinho Australiano, ainda que sejam da mesma uva: diferentes terroirs. A uva é a mesma, mas tudo ao redor não é: o solo, as leveduras, o clima, etc. Ela vai reagir de maneira diferente e adquirir as características do terroir em que está. Mesmo que seja a mesma uva, ela vai estar em solo e em terroir diferente, sob diferentes influências. O gosto, a textura, a cor, a estrutura tânica, a acidez, a maturação  da uva… tudo vai mudar dependendo… sim, do terroir. E eu sei que eu já repeti a palavra umas vinte vezes. Mas é pra fixar o conceito! 

Mesmo dentro de um país existem vários terroirs diferentes, e dentro deles, microterroirs. Essa geralmente é a chave para as delimitações de regiões e de denominações dentro do mundo do vinho. Ao longo do tempo, as pessoas começaram a perceber que diferentes terroirs davam características diferentes aos vinhos. Mais do que isso, que alguns terroirs eram melhores para certos tipos de uvas e certos estilos de vinho do que outros. 

As denominações de origem tem como base as características do terroir: mesmo com a mesma uva, um vinho de Pommard vai ser diferente de um vinho de Mersault, mesmo estando os dois dentro da Borgonha, e tudo isso dentro da França.  

Existem muito mais coisas debaixo da terra, Horácio, do que sonha nossa vã filosofia. Perdão, Hamlet, mas eu precisava usar essa frase. 

É normal para nós, bichos de cima da terra, não prestarmos muita atenção para o que acontece embaixo dos nossos pés – seja debaixo do cimento que pisamos, seja debaixo da grama. Na maioria das vezes, pensamos no solo como um amontoado de terra – e o erro está justamente aí. A maioria de nós vê o solo como uma coisa inerte, imóvel, estática, morta. E ele é qualquer coisa menos isso – o solo é vivo – e onde tudo começa. 

Meus queridos, bem vindos ao maravilhoso mundo do subterrâneo. O solo é muito, mas muito mais do que você imagina. Não é só o chão que pisamos. 

Sabe a infinidade de seres vivos que existe no Oceano e a maneira não temos a mínima noção do que acontece direito ali, principalmente nas partes mais profundas? É mais ou menos assim dentro da terra: existe uma infinidade de vida ali dentro, vivendo em conjunto e trocando idéia uns com os outros. Existem relações entre os seres vivos de diversas, inúmeras, incontáveis espécies, entre as raízes, entre as plantas, entre as plantas e os fungos, entre as bactérias e os animais – que ainda sabemos muito pouco. 

O que  temos são cidades, civilizações, amontoados muito organizados de Bactérias, fungos, criaturinhas microscópicas ou pequeninas como protozoários , artrópodes, vermes de todos os tipos e tamanhos que vivem, comem, fazem suas necessidades no ambiente, se apaixonam se e reproduzem todos os dias.  Mais do que isso, eles fazem parte de cadeias alimentares e participam de relações simbióticas entre eles mesmos e entre eles e as plantas.  O resultado disso é uma rede gigantesca de influências sobre as parreiras – e consequentemente, sobre as uvas e o nosso vinho. Quem diria que um verme fosse fazer tanta diferença naquele vinho caríssimo, hein? É, coisas da vida. 

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Nessa altura do campeonato, você deve estar se perguntando: mas sempre me disseram que pra fazer vinho a uva precisava de um solo ruim. Ok, isso é verdade. Mas solo difícil, cheio de pedregulho, pouco fértil, que a videira tem que se esforçar pra buscar os nutrientes lá embaixão da terra … não quer dizer solo morto. São coisas absolutamente diferentes. 

Por outro lado, podemos ter um campo inteiro de monocultura extensiva tratado unicamente com insumos sintéticos, e que se mostra extremamente fértil: você vai continuar produzindo, enquanto continuar fazendo as aplicações de químicos. Mas se for analisar o solo, ele estará totalmente desgastado – morto. É mais ou menos como fazer você correr uma maratona por dia, ficar sem dormir, e tentar se manter a base de pílulas estimulantes. Uma hora seu corpo não vai mais aguentar e você vai ficar totalmente debilitado. O solo é a mesma coisa. 

Até mesmo por ignorar todas as relações importantíssimas entre a vida no solo, as plantas e a agricultura ( sem falar no produto final que vai direto pro nosso estômago ) o homem acabou devastando bastante suas terras cultiváveis. Isso, aliado ao progresso, claro, sempre de benefícios ambíguos e um sistema social baseado em produtividade e lucros na maioria dos lugares. Agricultura de monocultura em escalas napoleônicas, invenção de fertilizantes sintéticos, surgimento de defensivos químicos ( os famosos agrotóxicos ) …. acabaram fazendo com que o “normal” em uma plantação – leia-se aqui também um vinhedo – fosse um solo sem vida. Pois você pode forjar a saúde de uma plantação artificialmente. 

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Basicamente o que conhecemos como agricultura moderna foi cunhado no séc. XX: o mundo pós segunda guerra mudou completamente o modo com que as pessoas lidavam com o plantio e com a alimentação. Os fertilizantes químicos, os pesticidas, a agricultura extensiva, o confinamento de animais, industrialização dos alimentos, a explosão demográfica nos centros urbanos: tudo isso contribuiu para chegarmos num ponto em que os solos estão cada vez piores. E não pensem que estou falando só de milho ou de soja. Para vocês terem uma ideia, 80% dos gases emitidos responsáveis pelo efeito estufa são provenientes de criações industriais de animais. 

Se em um terroir saudável a videira é uma planta que pode atingir facilmente 100 anos, em um vinhedo submetido a um equilíbrio “artificial”, à base de tratamentos em demasia e sem utilizar o bom senso – ela pode não durar nem 20 anos – e morrer, literamente, por fadiga e solo em stress. Daí são todas replantadas. Num solo saudável, a videira vai ter acesso a nitrogênio; fósforo; cálcio; magnésio; e outros muitos como o ferro, o potássio, boro e manganês, todos elementos vitais para a saúde da planta. Em um vinhedo com o solo empobrecido, a videira provavelmente vai ter acesso somente aos elementos básicos do fertilizante sintético: nitrogênio, potássio e fósforo. É como se alimentar só com arroz e esquecer do feijão. 

Sem contar que a produção agrícola industrial é um estilo de produção totalmente não sustentável: você consome petróleo para sintetizar o fertilizante. Você usa pesticidas para controlar as pragas. Nisso, você polui o ambiente e ainda empobrece o solo. 

Estima-se que a quantidade de desertos no mundo tenha aumentado sensivelmente desde que o homem inventou a agricultura – e coincidentemente, o aumento foi galopante depois do séc. XX, século da agricultura industrial. Rios, lagos frequentemente são contaminados com resquícios de pesticidas. Chuvas, idem. Ou seja, é meio que um caminho sem volta.

Em um primeiro momento, esse ritmo de produção baseado em produtividade e rendimentos a partir de insumos químicos foi um “avanço” tecnológico. O crescimento populacional, a situação pós-guerra, tudo foi motivo para a criação de um sistema que fosse mais produtivo, eficiente, rentável e fácil no manejo – e que com o tempo, claro, se tornou a loucura que é hoje  a agricultura moderna. 

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A boa notícia? Já estamos vivendo a era da reversão. Hoje em dia, décadas depois, já sabemos dos riscos e dos malefícios que esse tipo de cultivo causa ao meio ambiente e também à saúde do homem. São inúmeros os estudos sobre o empobrecimento do solo, sobre o efeito dos pesticidas nos trabalhadores rurais, sobre os resíduos em alimentos, sobre a poluição das águas, sobre o esquecimento de espécies e sementes nativas. Sem contar toda a curva de gente – e acreditem, não é pouca – que faz uso irregular dos insumos químicos  – e isso nem aparece nos dados oficiais. 

Por  essas e outras, a tendência mundial que vemos, inclusive nos vinhos, é de converter o cultivo para um cultivo sustentável ou mesmo orgânico. O que pode ser difícil, trabalhoso, menos rentável e menos produtivo, ao longo do tempo pode se mostrar mais barato, menos prejudicial ao ambiente e ao homem…. e querendo ou não, é a única saída que temos.  

A questão em si, obviamente, não é demonizar a viticultura ou a agricultura industrial feita até hoje; mas sim, pensar em alternativas que a longo prazo sejam benéficas para todo mundo. É, muito além de radicalismos ou ideologias impraticáveis, usar nosso bom senso e o que a tecnologia e a ciência nos trouxe de bom, utilizar todo o conhecimento possível nessa área… mas eliminar também o que elas nos trouxeram de ruim. 

Mas nem só pequenas e simpáticos seres vive nosso solo.  Inúmeras outras relações físicas e químicas acontecem lá embaixo. Temos os componentes minerais, como os que eu citei acima, que  entram nas raízes das plantas através de trocas iônicas. Temos a água, importantíssima para qualquer cultivo, vindo de cima ( das chuvas ) e também de baixo, nas diversas camadas subterrâneas. Temos os solos mais variados, compostos de basalto, xisto, calcáreo, pedras de seixos, argila, areia, granito..  que vão influir na absorção, temperatura, acidez do solo e drenagem de água. 

Pesticidas químicos e a deterioração do solo: 

A OMS define como “pesticida”  “toda substância capaz de controlar uma praga, em sentido amplo, que possa oferecer risco ou incômodo às populações e ambiente”. Podem ser uma substância ou uma mistura de susbtâncias químicas capaz de diversos efeitos. 

Pesticidas químicos são os nossos conhecidos “agrotóxicos”. Ou também chamados “defensivos agrícolas”. O termo agrotóxico inclui inseticidas (controle de insetos), fungicidas (controle de fungos), herbicidas (combate às plantas invasoras), fumigantes (combate às bactérias do solo), algicida (combate a algas), avicidas (combate a aves), nematicidas (combate aos nematoides), moluscicidas (combate aos moluscos), acaricidas (combate aos ácaros), além de reguladores de crescimento, desfoliantes (combate às folhas indesejadas) e dissecantes.

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Hoje, na maioria dos vinhedos o mais usado é o que chamamos de agricultura “convencional”: é o cultivo baseado em insumos químicos para fertilizar, prevenir, tratar, conservar. Não só nos vinhedos, mas em qualquer outro tipo de cultura ( milho, soja, tomate, morangos ), o normal é fazer uma monocultura ( plantar só um tipo de alimento ), evitar as ervas daninhas e outras plantas que podem “atrapalhar” o cultivo e competir com as parreiras pelos nutrientes ( usando herbicidas ) , fazer fertilização química se necessário e tratar as videiras com diversos pesticidas dependendo da ocasião – como fungos, por exemplo. Por vezes, utilizar um conservante, como o sulfito, aplicado nas uvas para melhor conservação e eliminação de algumas bastérias e leveduras indesejadas.  Ok, até aí, o pensamento lógico é que as coisas foram criadas pensando na melhoria da produtividade e da qualidade do produto, certo? 

Pois é. Mas o que pouca gente se dá conta é dos abusos que são feitos em nome da praticidade, produtividade e “saúde” das vinhas. Inventamos um conceito de agricultura que depende de remédios e que pouco a pouco deteriora nosso solo.  

A monocultura, por exemplo, é um exemplo bastante moderno – que é o plantio exclusivo de apenas um tipo de coisa. O terreno “limpo”, sem as chamadas ervas ”daninhas” ( ou seja, ervas que “danificam”a plantação ) é tão moderno quanto. São dois conceitos que surgiram e criaram força depois da segunda metade do século vinte, com a necessidade mundial de produções em larga escala, produtivas, certas e rentáveis.

Em um vinhedo onde existem ervas e plantas de outros tipos, vai haver competição por água e nutrientes do solo entre elas.  Assim como, se existem ervas altas, a circulação de ar e a fotossíntese podem afetadas. Com uma baixa circulação de ar, a probabilidade de aparecer algum tipo de mofo nas uvas é maior. Esse é um dos exemplos do por que em uma agricultura comercial convencional as plantas e ervas são retiradas do vinhedo. Assim as videiras – no caso – tem mais água e luminosidade disponíveis, e o manejo nos vinhedos fica mais fácil. Mais água, mais luz, menos trabalho? Parece o paraíso. E é exatamente o que os herbicidas oferecem: eles matam as ervas e plantas “daninhas” que competem pelos menos nutrientes, e deixam as videiras livres para crescer e produzir sem nenhuma interferência.  

Mas claro que não é tão fácil assim. Não existe “monocultura” de nada na natureza. Isso foi invenção do ser humano. E se foi invenção do ser humano, já dá pra imaginar que uma hora ou outra vai haver uma patinada.

Pois é: a maioria das plantas e chamadas ervas “daninhas” são justamente responsáveis por aportar uma quantidade considerável de elementos indispensáveis para um solo saudável, tais como magnésio, ferro, boro, flúor, manganês, cobre, zinco, etc. Sem elas, o solo fica carente desses elementos.

Quando conversamos com viticultores “naturebas”, muitos dizem que o início do fim é a utilização dos herbicidas, que é o pesticida mais “light”, digamos assim, e o primeiro a ser usado. Mas eliminar a vida ( nesse caso, ervas e plantas de diferentes tamanhos) nos vinhedos implica muito mais do que somente um padrão de rendimento ou estético: você elimina junto com essas ervas toda uma primeira camada de bactérias do solo, que de alguma maneira tem relação com essa vegetação. E só para citar um nutriente: são justamente algumas dessas bactérias as responsáveis por fixar o nitrogênio, importantíssimo para a nutrição, crescimento e saúde de qualquer vegetal. E assim como elas, cada joaninha, erva, raiz, bactéria, pedra e florzinha dentro de um ambiente em equilíbrio, tem a sua devida função, mais ou menos importante, no balanço geral das coisas.

Tirar as ervas e plantas de um vinhedo e esperar que ele “funcione” normalmente é mais ou menos como tirar parte do seu intestino, um dos seus rins, e esperar que você continue vivendo da mesma maneira sem tomar alguns remédios e sem estar ligado a alguns tubos. 

Bom, mas vamos aos vinhedos. Em uma situação ideal, na natureza, os elementos são retirados do solo pelas plantas e depois retornam a ele quando elas ou os animais que se alimentaram delas morrem. 

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Imaginemos que nosso viticultor resolveu investir em herbicidas para “facilitar” a sua produção e eliminar as danadas das ervas “daninhas”. Depois de um tempo, resumindo a grosso modo, o solo vai começar a ficar pobre em alguns compostos minerais que só aquelas ervas e plantas conseguiam “devolver” para o solo. As videiras vão ficar com carência de nutrientes  e da mesma maneira que nós, quando não nos alimentamos da maneira adequada, e elas vão começar a ficar doentes.  Doentes mesmo. Uma série de enfermidades e bactérias ( que não existiriam se elas estivessem saudáveis ) vão surgir.  E sim, videiras doentes, além de produzirem menos e com menos qualidade, uma hora morrem.

Solução? Tã rãnnn!  Fertilizantes químicos para suprir a falta de nutrientes minerais e bactericidas e antibióticos para matar as bactérias (diferentes daquelas que foram retiradas dos solos ) que atacaram o vinhedo doente.

Mas esses “antibióticos” ( que matam bactérias ) vão afetar também a superfície das folhas das videiras e as bactérias que existiam ali como uma proteção natural. Pronto, já entornou mais um pouco o caldo. 

Se pensarmos então em uma situação onde o vinhedo é isolado de qualquer outro ecossistema, como bosques, florestas, matas e etc. ( que é o que acontece com as grandes parcelas de vinhedos em escala industrial ), não teremos também a convivência de insetos ou de animais nesse vinhedo ( isso por que estamos apenas falando da barreira física da distância, e não entramos ainda nos inseticidas, que afastam os insetos das plantações).

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E daí? Bom, só um exemplo: alguns insetos comem ácaros. Ácaros podem contaminar um vinhedo inteiro e exterminá-lo. Problema com os ácaros? Utilização de acaricidas.

Já viram para onde vai isso, não? Um solo danificado gera um ambiente também desiquilibrado. Plantas idem. Fruta idem. E pra curar tudo isso, haja remédio. 

Sabe aquela pessoa que começa a tomar um comprimido e depois de um tempo está tomando mais dez, pois depois acaba tomando um segundo sempre para controlar os efeitos colaterais do primeiro? 

Exatamente. Não existe remédio sem efeito colateral. E infelizmente boa parte da agricultura moderna, inclusive a viticultura convencional, resume-se hoje em dia a isso: administração de remédios para plantações desequilibradas. 

Obviamente, entre um vinhedo que não usa absolutamente nada e um vinhedo que usa absolutamente tudo, existe um zilhão de gente que se utiliza do bom senso. Por isso devemos sempre conhecer o máximo possível dos produtores, não se atentar à selos ou à prêmios, e se certificar que os vinhedos e a vinificação são saudáveis – ou, no mínimo, exigir que todos os processos feitos no vinhedo e na adega, assim como intervenções e aditivos, sejam discriminados nas fichas técnicas ou nos rótulos. Conheço muitos produtores que utilizam insumos químicos com moderação, assim como conheço muitos produtores que utilizam de forma totalmente indiscriminada. 

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31/8/2018
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