Vinhos

Barranco Oscuro: produtor de vinho natural, sem adição de sulfito, espanhóis, em Granada. Parece mentira mas mas não é.

São naturais. E são de Granada. E não adicionam SO2. E estão nos vinhedos mais altos da Europa ( e ainda é Andaluzia ). E tem provavelmente mais horas de sol do que 90% do mundo vitivinícola. E tem Pinot Noir de 10 anos que ainda está com taninos duros. E fazem Virirriega e Listán Negro ( a nossa País lá no Chile ). E também Riesling. E já provei um 1999, sem sulfito, que estava jovem. E tem Pinot de 16% de álcool natural. É. Barranco é uma porrada atrás da outra pra quem acha que entende alguma coisa de vinho.
Ufsss, mas vamos lá. 
Passou a feira e com ela o turbilhão de vinhos e de produtores maravilhosos – brasileiros e “importados” que tivemos por aqui. Um deles era o Barranco Oscuro, produtor natural de Granada, que eu vivo falando aos quatro ventos, e que veio mostrar seus vinhos na nossa Naturebas 2015. Não escondo que é um dos produtores que mais admiro e alguns dos melhores vinhos que já bebi. Além de alguns dos mais impactantes. Desde que os conheci, estou querendo trazer os vinhos aqui pro Brasil – até para poder beber todo dia – mas ultimamente com esse câmbio tresloucado o negócio tá meio difícil. De qualquer forma, nada mais adequado do que postar agora minha visita, em Março, na Barranco Oscuro, quando visitava os produtores naturebas portugueses e Espanhóis.
Depois de quase quatro anos ensaiando essa visita, o coração bateu mais forte quando finalmente cheguei lá. 
Lá em 2011, quando escrevi alguma coisa sobre vinhos naturais no meu blog ( gente, que vergonha, devo ter escrito tanta besteira, já… hahaha ) , um rapaz me escreveu: ” lis, você conhece os vinhos naturais espanhóis?”. Eu disse que não. “Então….. eu produzo”. Era nada mais nada menos que Lorenzo Valenzuela, filho de Manolo Valenzuela ( na foto de cima ), fundador da Bodega Barranco Oscuro. 
Manolo é considerado o pai de muitos vinhateiros ligados ao vinho pura e o pioneiro por lá nesse tema. E o Lorenzo, super ativista e conhecedor radical do assunto. Junto com a esposa, Luisa Chova ( da Vinos Autenticos, que depois falo mais ) organizam feiras, promovem a cultura, e claro…….. elaboram ali, Lorenzo e Manolo, alguns dos melhores vinhos que já provei na vida. Falo de novo. 

Natural.

(Del lat. naturālis).

3. adj. Hecho con verdad, sin artificio, mezcla ni composición alguna. 

( está nas citações favoritas do Lorenzo….)

Lorenzo conta que quando o pai chegou por ali, começou a fazer vinhos como se fazia na região: logo depois já quis fazer, em vez de apenas claretes, brancos ( com Vigiriega ), tintos ( de Cabernet, primeira variedade estrangeira implantada ali) e rosés ( com garnacha). Comprou um trator para aragem ( geralmente por ali se arava com burros ) e quando não arava suas terras, arava as terras dos vizinhos para ganhar um dinheiro extra. 

Com o tempo, foi plantando outras variedades, implantando outros vinhedos, fazendo cada vez mais vinhos voltados para a qualidade e pureza. Sempre trabalhou sem insumos e sem nenhum químico na videira – e até hoje eles fazem um vinho totalmente natural, sem adição de sulfuroso. Eles foram pioneiros na região em muitos sentidos, e continuam sendo como militantes do vinho natural na Espanha.

1368 é um dos vinhos emblemáticos do Barranco: uma mescla de uvas que leva o nome da altura dos vinhedos… 1368 metros acima do nível do mar. Foi um dos vinhos que, também em 2011, me deu uma alegria imensa de provar: um 1999 sem sulfitos, totalmente vivo. Pra provar pra todo mundo que conservação de vinho não é feito só com conservantes adicionados. Quando perguntei para o Manolo sobre sua opinião sobre os conservantes no vinho, ele foi muito simples na explicação: se o vinho está saudável, ele vai durar. Se ele tem acidez, taninos, álcool e vida dentro dele, ele vai se manter por muito tempo, pois o equilíbrio dá estabilidade e longevidade ao vinho. 
Outra vez que tomei esse 99 foi no meu aniversário de 30 anos – guardei a garrafa para abrir em uma data especial, e como só se entra para o time das balzacas uma vez na vida, foi ali que a abri. E estava, pra variar, de tirar o fôlego. Das mais recentes, a 2001, 2004 e 2005 estão deliciosas – o 04 é uma lady, delicada, sedutora, etérea. O 2005 está másculo e musculoso, mas sem perder a elegância – um Bond em seu terno….. Rs
Tem Pinot Noir em Granada? Tem sim senhor. O Pinot da Barranco foi o primeiro soco no estômago que levei quando os conheci em Paris em 2011. 
E os Pinots deles continuam a me deixar de cabelo em pé. Esse é o Pinot Rojo, de menor extração, mas que mesmo assim em alguns anos ( como 2011 ) atinge os incríveis 16% de álcool ( yeaph, leveduras naturais, minha gente ), potência de búfalo e elegância de flamingo. Outro Pinot, o primeiro que eles fizeram, é o sem-noção-alguma Borgoñon Granate, é pra dar risos nervosos em qualquer um que pensa entender alguma coisa de vinho. Pinots absurdamente estruturados, taninos galopantes, profundidade de abismo e muita, muita complexidade, diferente de qualquer coisa que já provei. 
Um deles, um Pinot 2004 ( todos sem sulfito adicionado, só pra lembrar ) estava ainda jovem, duro e fechado, com um amargor de cacau que é praticamente uma injeção de resveratrol na veia, com mais de 16 graus de álcool. Eu gostei. Eles não gostam tanto, acham que ficou um vinho muito duro. Os outros se mantém com mais frescor, menos álcool e mais fluidez – mas é muito interessante ver o que essa uva é capaz aqui nos extremos. Y sin perder la ternura….
“Hay que tener en cuenta que hoy los mercados, por lo general, piden tipos casi uniformes sobre todo en materia de caldos vínicos y esa uniformidad no es posible obtenerla sin apelar a medios por decirlo así artificiales…” 

(Federico P. Albertí, Elaboración de Vinos Naturales y Artificiales, 2ª ed, 1905)
Esse é o Lorenzo Valenzuela, que conheci pessoalmente, junto com o pai, Manolo Valenzuela e com Ramón Saavedra ( da Cauzón ), em 2011, numa feira de naturais de Paris, a Le Vin en Tete. 
Depois de trocar uma ideia sobre os naturais espanhóis, Lorenzo me disse que eles estariam nessa feira em Paris. E eu, num acesso de loucura, rapei a conta do banco, comprei as passagens e fui lá num bate volta de 4 dias para conhecer a Barranco Oscuro e outros produtores naturebas. 
Confesso que não tinha a menor idéia de como iam ser esses vinhos “sem sulfito, naturais, espanhóis de granada, perto da serra Nevada”. 
Aliás, tinha minhas dúvidas ( afinal era um terroir que não conhecia, aliás, na minha ignorância vitivinícola, nunca tinha ouvido falar..). Resolvi chegar na feira e ir direto pra mesa do Barranco, para já degustar os vinhos logo de cara. Pois é – isso acabou com minha feira. Os vinhos deles eram alguns dos melhores dali…. Rs… 
E assim começou minha história de amor com o Barranco Oscuro. 

A bodega leva o nome do lugar onde fica, um barranco, o “barranco oscuro”. Parece que existiam árvores muito altas na baixada, ou que o sol fazia sombra bem nessa parte. Só sei que o chamavam de barranco escuro. 

O curioso foi que quando Manolo, lá perto de 80, comprou a propriedade ( que aqui chamam cortijo ), estava um dia cheio de neblina. E mesmo sem ver nada, ele se apaixonou pelo local e decidiu ficar: tinha uma casa com uma boa cozinha, e uma adega onde antigamente faziam vinhos. 
No dia seguinte, quando a névoa se dissipou, ele pode ver a paisagem maravilhosa do lugar. Do ponto mais alto se avista o mar e até a África. Rodeado pelas montanhas e pelos picos da Serra Nevada. 

Eu, quando cheguei, também cheguei em um dia de neblina- das grossas. Nesse ponto se vê o mar e a África ) mas só consegui ver o marzão branco de nuvem – e nem preciso dizer que também já estava apaixonada pelo lugar mesmo assim.

Vino Costa é uma homenagem aos vinhos que se faziam ali na região da serra: quando Manolo chegou por ali, já havia uma tradição muito grande de vinhos, feitos com mesclas de uvas tintas e brancas, dando origem a um vinho simples, muito alcoólico ( a região dá vinhos bem alcoólicos principalmente pelo solo e por causa do sol e da falta de água – pois chove muito pouco e as uvas ficam extremamente concentradas); das variedades Montuva, Pedro Ximenes e tinturera. 
As pessoas tinham muito pouco conhecimento de vinificação e muitas delas nunca tinham saído da serra; por isso eram vinhos rústicos e, segundo Lorenzo, alguns até desagradáveis, de tão truculentos. 
Ele diz que algumas pessoas nem sabiam como deixar o vinho tinto ( era só deixar as cascas mais tempo com o mosto, pois eles já colhiam e prensavam tudo junto, por isso que o vinho ficava rosado). 
Nesse Vino Costa da Barranco, obviamente, não dá nem pra imaginar tudo isso: pois é um clarete fino, delicado, com notas cítricas de toranja, muita casca de cítricos, ervas, camomila, bosque, de acidez saltitante e um delicado equilíbrio entre o solar e o fresco. Pra beber de litro…….. Feito com Listán Negro ( uva das canárias que também se conhece aqui como Palomina ) e outras brancas, como Pedro Ximenes.

Desfile dos branquelos naturebas logo na chegada ao Barranco ( aliás, os espanhóis são bons de copo, só digo isso….. Rs…). 

Da esquerda pra direita, Riesling, Chardonnay, Virirriega ( casta regional que o Manolo começou a fazer os brancos aqui na Barranco ), e Sauvignon Blanc. Além dos vinhos serem de chorar ( de emoção, sempre), os rótulos e os nomes são um deleite à parte. 
O Chardonnay, por exemplo, é o Cardonohay : alguns chamam o vinho por aqui de “caldo”, mas isso dá uma conotação levemente pejorativa. No “sotaque” andaluz, onde se substituem os l’s pelos r’s, o caldo é o “cardo”. E cardo, aqui, não há: Cardo-no-hay. Genial, não?! Rs a mesma linha segue no Ring Ring ( Riesling), 

no Musk ( Moscatel ), Pino Rojo ( Pinot Noir ), e por aí vai. Haja criatividade, mesmo porque pela legislação eles não podem colocar o nome da uva no rótulo…..

 

8/8/2015
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